Ansiedade, cognição e o mapa do CID-11: A visão da TCC (6B00-6B0Z)

A lente interior e o rio da mente — Reconstruindo o medo pela TCC

Por Eduardo Brancaglioni Marquetti Lazaro, CRP 06/199338

05/11/2025 às 20:33, atualizado em 05/11/2025 às 20:33

Tempo de leitura: 4m

A Ansiedade Generalizada (TAG — 6B00 pela CID-11) pode ser entendida, sob a ótica cognitiva, como um estado mental de alerta hipersensível. O indivíduo com TAG opera com uma crença subjacente de que o mundo é perigoso e de que ele não tem recursos suficientes para lidar com o perigo iminente. O foco não está no perigo real, mas na superestimação da ameaça e na subestimação da própria capacidade de coping. É a preocupação crônica, o pensamento desadaptativo sobre o futuro, que sustenta o ciclo de sofrimento e inquietação.

Tenho pensado na mente humana como um rio, onde as águas da emoção são moldadas pelas margens, por vezes estreitas, do pensamento. Frequentemente, a turbulência que sentimos não nasce da força da água, mas da rigidez das margens que tentam contê-la. Essa turbulência, no contexto da ansiedade crônica, é uma manifestação visceral de um princípio fundamental da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC): o que sentimos não é o evento, mas a nossa interpretação sobre ele.

Não é a possibilidade de perder o emprego que gera o pânico, mas o pensamento automático que se segue a essa possibilidade: “Se eu perder o emprego, serei um fracasso total e ficarei desamparado”. É o significado catastrófico que damos ao evento neutro que dispara a cascata emocional de angústia e o comportamento de esquiva ou preocupação incessante.

A ciência comportamental nos oferece um mapa claro para navegar por essa complexidade: o Modelo Cognitivo. Ele se manifesta em uma tríade inseparável e autoalimentada:

Imagem do artigo: Ansiedade, cognição e o mapa do CID-11: A visão da TCC (6B00-6B0Z)

Se o pensamento que surge é “Isso é insuportável e vai dar errado” (uma distorção cognitiva como a catastrofização), o sentimento será, inevitavelmente, a ansiedade ou o medo intenso. Em resposta a essa emoção, o comportamento será a paralisação, a ruminação ou a evitação (como, por exemplo, não enviar um currículo ou adiar uma tarefa). Esse comportamento, por sua vez, reforça o pensamento original de incapacidade, fechando o ciclo e fortalecendo as crenças centrais de desamparo.

Se essa lente de pensamento tem tornado sua paisagem interna turva, talvez seja o momento de pausar e reexaminar o que está, de fato, em foco. A TCC é, antes de tudo, um convite à tomada de perspectiva, à observação distanciada de nossos próprios padrões mentais.

O rigor da TCC, embasado em décadas de pesquisa por Aaron T. Beck e colaboradores, reside exatamente nessa desmistificação: a ansiedade é um produto da mente, e, portanto, pode ser modificada pela mente. Não como um mero "pensamento positivo", mas através da flexibilização cognitiva sistemática e estruturada.

Estudos de outcome e meta-análises amplas, como aquelas conduzidas por Butler et al. (2006) em análises Cochrane, demonstram a eficácia robusta da TCC para transtornos de ansiedade. Essas evidências não apenas a colocam como uma intervenção de primeira linha, mas mostram que ela promove mudanças duradouras que superam o efeito placebo, oferecendo uma variação na magnitude do efeito (effect size) clinicamente significativa. A eficácia não é mágica; é a aplicação metódica do princípio de que podemos aprender a desafiar e a substituir as narrativas mentais que nos aprisionam.

Você não está aprisionado ao medo. Você está, possivelmente, aprisionado à forma como pensa sobre ele. O trabalho é desarmar essa central de alarme hiperativada, trazendo-a de volta para o aqui e agora, onde a maior parte dos perigos imaginados simplesmente não se materializa. O trabalho é de um detetive que busca evidências, e não de um advogado que apenas defende o caso da ansiedade.

É nessa investigação guiada que a liberdade se encontra. Para começar a desvendar o poder que você confere aos seus pensamentos automáticos, sugiro um breve e honesto interrogatório socrático com você mesmo, neste exato momento de leitura:

A resposta a essas perguntas é o primeiro passo prático para transformar as margens estreitas e rígidas do seu rio mental em um curso mais amplo e acolhedor.

Referências

BUTLER, G.; CHAPMAN, J.; FORBES, P. et al. The empirical status of cognitive-behavioural therapy: a review of meta-analyses. Clinical Psychology Review, v. 26, n. 1, p. 17-31, 2006. DOI: 10.1016/j.cpr.2005.07.003.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-11). 2023. Disponível em: https://icd.who.int/browse11/l-m/en. Acesso em: 5 nov. 2025.

BECK, Aaron T.; ALFORD, Brad A. O Transtorno de Ansiedade e suas Comorbidades: Uma Perspectiva Cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2011.

Foto de Tim Gouw: https://www.pexels.com/pt-br/foto/homem-de-camisa-branca-usando-macbook-pro-52608/

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Eduardo Brancaglioni Marquetti Lazaro Psicólogo com Foco na Terapia Cognitivo-Comportamental para Ansiedade, Depressão e Alterações de Humor

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