Ainda vivemos sob a sombra cultural de que, no divórcio, a equação natural resulta na criança sob os cuidados da mãe, restando ao pai o papel de coadjuvante. Essa crença está enraizada no conceito popular, e muitas vezes equivocado, de "instinto materno" como uma força biológica insuperável que tornaria a mulher a única cuidadora apta. No entanto, quando olhamos para as evidências da psicologia clínica, percebemos que a competência para criar um filho não reside nos cromossomos, mas na história de aprendizagem e na disponibilidade afetiva. A ideia de que a criança sofrerá danos irreparáveis se criada principalmente pelo pai é um mito que a ciência vem desmontando peça por peça.
A paternidade como comportamento aprendido
Para entender por que um pai é perfeitamente capaz de assumir a guarda unilateral ou principal, precisamos recorrer a B.F. Skinner. Em sua obra Ciência e Comportamento Humano, Skinner nos ensina que grande parte do que chamamos de "amor parental" é composto por comportamentos operantes — ações que aprendemos e mantemos porque geram consequências no ambiente.Quando um pai alimenta, acolhe o choro, troca a fralda e brinca, ele está passando por um processo de modelagem. Não existe um chip genético que ensina a acalmar um bebê; existe uma história de reforço. Se o pai pega a criança no colo e ela para de chorar, esse comportamento é reforçado positivamente. Skinner argumentaria que a habilidade de cuidar é adquirida através da exposição contínua às necessidades da criança. Portanto, o pai que assume a custódia não está lutando contra a natureza; ele está apenas exercendo um repertório comportamental que foi desenvolvido (ou será desenvolvido) através da prática e da constância, exatamente como acontece com as mães.
Distorções cognitivas e a pressão social
O maior obstáculo para o pai que assume a guarda muitas vezes não é a falta de habilidade, mas a insegurança gerada por crenças sociais. Aaron Beck, fundador da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), explica que nossas emoções são ditadas pela forma como interpretamos os eventos. Um pai solteiro pode ser bombardeado por pensamentos automáticos disfuncionais, como "eu nunca serei capaz de nutri-lo emocionalmente como a mãe faria".Beck classificaria isso como uma distorção cognitiva chamada "afirmação do tipo deveria" — regras rígidas sobre como nós ou os outros deveriam se comportar. A sociedade diz que a mãe "deveria" ser a base, e o pai, ao desafiar isso, sente-se um impostor. Na clínica, trabalhamos para reestruturar essa crença central de inadequação. Substituímos o pensamento "falta uma mãe aqui" por "existe um cuidador responsivo e amoroso aqui". A criança não necessita de um gênero específico para se desenvolver; ela necessita de previsibilidade, afeto e limites, qualidades humanas acessíveis a qualquer adulto comprometido. A plasticidade do afeto e a adaptação
Embora a neuropsicologia não seja o único foco, é importante notar que a biologia apoia a psicologia comportamental. Estudos contemporâneos indicam que, quando o pai se torna o cuidador primário, seu cérebro sofre adaptações semelhantes às observadas em mães, ativando redes neurais ligadas à empatia e vigilância. Isso valida a tese behaviorista de que a função faz o órgão: é o ato de cuidar que molda o cuidador.
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR) alerta que o risco para o desenvolvimento infantil não está na ausência de uma figura materna biológica diária, mas na presença de negligência ou instabilidade no ambiente doméstico. Se o pai provê um ambiente seguro, livre de estressores tóxicos e rico em interações positivas, a criança prospera. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça, em suas diretrizes sobre desenvolvimento infantil, que o apego seguro se forma com quem provê cuidado consistente, independentemente de ser o pai, a mãe ou outro guardião. Conclusão
A transição da criança para a casa do pai não deve ser vista como um "plano B" ou uma tragédia familiar, mas como uma reconfiguração válida e saudável do núcleo de cuidado. A dor da separação conjugal é real, mas a capacidade humana de adaptação é imensa. Ao desconstruir o mito da insubstituibilidade materna, não estamos desvalorizando as mães, mas empoderando os pais a ocuparem o lugar que lhes é de direito: o de protagonistas na vida dos filhos.
Para a criança, o que importa não é quem assina a custódia no papel, mas quem está lá para ler a história antes de dormir, quem valida seus sentimentos e quem oferece a mão firme para atravessar a rua. E isso, a psicologia garante, um pai pode fazer com maestria.