CID-11 (QE85) Pós-burnout: cicatrizes na vida após o furacão

Os efeitos persistentes e a jornada da recuperação

Por Eduardo Brancaglioni Marquetti Lazaro, CRP 06/199338

21/10/2025 às 05:16, atualizado em 21/10/2025 às 05:16 | Tempo de leitura: 4m

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1. Introdução

A síndrome de burnout é formalmente reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um fenômeno ocupacional (CID-11: QE85). A experiência do burnout assemelha-se a um "furacão psicossocial" que, ao cessar, deixa a "vida danificada" por sequelas persistentes. No DSM-5-TR, o burnout é categorizado em "Outras Condições que Podem Ser Foco de Atenção Clínica" (Z73.0), sublinhando sua natureza não primária como transtorno mental. O objetivo deste trabalho é delinear as manifestações residuais do burnout, fundamentadas na estrutura diagnóstica do CID-11 e do DSM-5-TR.

2. Desenvolvimento e Resultados: Efeitos Persistentes Pós-Síndrome

O burnout atua como um fator estressor crônico que desregula os sistemas neuroendócrino e de resposta ao estresse. Esta desregulação se manifesta clinicamente em comorbidades que se enquadram nas seguintes categorias de classificação:

2.1. Manifestações Depressivas Subclínicas (CID-11: 6A0Z | DSM-5-TR: Transtornos Depressivos)

Observa-se um estado que, embora possa ser diagnosticado pelo DSM-5-TR como Outro Transtorno Depressivo Especificado (se os critérios completos não forem preenchidos), apresenta rebaixamento do humor, anedonia e fadiga residual. Estes sintomas se enquadram no bloco dos Transtornos de Humor (CID-11: 6A0Z), indicando uma falha na completa recuperação do tônus hedônico e vital.

2.2. ansiedade Generalizada Residual (CID-11: 6B40 | DSM-5-TR: Transtorno de ansiedade Generalizada)

A hipervigilância do burnout persiste, manifestando-se como Transtorno de ansiedade Generalizada (DSM-5-TR: 300.02). O indivíduo permanece com preocupação excessiva e desproporcional sobre a possibilidade de recorrência da síndrome ou eventos futuros. Esta persistência de ativação do sistema nervoso autônomo é classificada no bloco dos transtornos de ansiedade (CID-11: 6B40).

2.3. Distúrbios Persistentes do Sono (CID-11: 7A0Z | DSM-5-TR: Transtornos do Sono-Vigília)

A insônia torna-se um resquício comum, enquadrando-se no bloco dos Transtornos de Sono-Vigília (CID-11: 7A0Z). O DSM-5-TR categoriza isso como Transtorno de insônia, destacando que o corpo, condicionado pelo estresse, transforma o repouso em vigília tensa. A falha na restauração do sono compromete a regulação emocional e a recuperação cognitiva.

2.4. Alterações de Personalidade e Comportamento (CID-11: 6D1Z | DSM-5-TR: Transtornos da Personalidade)

O estresse extremo pode induzir rigidez nos mecanismos de defesa, manifestada como aumento da irritabilidade, hipersensibilidade à crítica e medo de falhar. Tais padrões, se clinicamente significativos, seriam avaliados no DSM-5-TR dentro da categoria Transtornos da Personalidade, alinhando-se ao bloco mais geral do CID-11 (6D1Z), comprometendo a funcionalidade interpessoal e profissional.

3. Discussão: Reestruturação e a Metáfora da Vida Danificada

O tratamento para o Pós-burnout deve ir além da remissão sintomática. Em termos metafóricos, o burnout é um "furacão" que, ao cessar, deixa a vida danificada, com as esferas profissional, social e familiar apresentando rachaduras e disfunções.

Essa perspectiva enfatiza que a intervenção precisa focar na reestruturação da base existencial. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é crucial para a "remoção de entulho" (identificação de cognições disfuncionais). Contudo, a recuperação exige "testar a carga" da funcionalidade e "reaprender o equilíbrio", conforme a perspectiva psicopatológica de Dalgalarrondo (2021). A cicatriz psicopatológica deve ser integrada como uma marca de superação que fortalece a estrutura da vida e previne futuros colapsos.

4. Conclusão

O Pós-burnout configura um estado de sequelas clínicas que exigem intervenção especializada. O objetivo terapêutico é facilitar a reconstrução de uma nova estrutura psíquica, resistente e consciente dos próprios limites. A recuperação plena, no contexto da "vida danificada", envolve a remissão das comorbidades residuais e a consolidação de novos padrões de enfrentamento, transformando a experiência traumática em um alicerce para uma saúde mental duradoura e funcional.

Fontes e referências

Referências

  • American Psychiatric Association (APA). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders: Text Revision (DSM-5-TR). 5th ed. Washington, D.C.: American Psychiatric Publishing; 2022.
  • Dalgalarrondo, P. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2021.
  • Maslach, C. & Leiter, M. P. Understanding the burnout experience: recent research and its implications for psychiatry. World Psychiatry, 2016; 15(2): 103–111.
  • Organização Mundial da Saúde (OMS). Classificação Internacional de Doenças (CID-11). Genebra: OMS; 2019.
  • World Health Organization (WHO). Burn-Out an occupational phenomenon – ICD-11 Guidelines. 2018.

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